A Importância do Ceticismo e do Senso Crítico na Bruxaria

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Ceticismo: Tendência para não acreditar, para duvidar de tudo o que lhe é dito; incredulidade.

Superstição: Crença que faz com que alguém crie certas regras ilógicas, tenha medo de coisas inofensivas ou acredite em coisas sem fundamento.

Às vezes eu me sinto um peixe fora d'água por ser uma bruxa com uma dose tão grande de ceticismo, mas um artigo do Jason Miller, autor que admiro muito, foi o empurrão que eu precisava para escrever sobre esse tema tão pouco falado, mas que considero tão importante no meio bruxesco.

Não é porque bruxas são pessoas que veem o mundo por uma ótica diferente da maioria das pessoas  que podemos assumir que uma bruxa é uma pessoa que acredita em tudo que é considerado paranormal, místico ou esotérico. Ou até mesmo ser uma pessoa que considera a ciência limitada por não aceitar como científica as nossas práticas. Eu mesma, sendo uma pesquisadora acadêmica, concordo totalmente que não tem que aceitar mesmo. Há um método científico rigoroso e necessário e os métodos da Bruxaria não são científicos per se, ponto final. Isso faz da Bruxaria algo melhor ou pior? De forma alguma! Até porque a ideia não é essa. Não acho que nada tem que ser provado, mas sim experienciado pela bruxa.

Inclusive, uma autora que gosto muito, a Laurie Cabot, em seu livro que mais amo e recomendo, O Poder da Bruxa, argumenta que a Bruxaria é uma ciência. Discordo. Aliás, acho que esse tipo de afirmação só atrapalha ainda mais a visão que as pessoas têm da Bruxaria porque fica até parecendo que somos pessoas que não entendem das coisas e que não sabem o que realmente é a ciência, como uma pesquisa científica funciona, quais são os métodos científicos, etc. Ninguém tem a obrigação de saber, mas quando se afirma que a Bruxaria é ciência, os argumentos devem ser de acordo, isto é, científicos.

Por exemplo: Você fez um feitiço e deu certo? Ótimo. Mas se fôssemos fazer um experimento científico para analisar o efeito de um determinado feitiço para uma determinada intenção, aí já seria outra história. Até daria para fazer, mas um dos princípios da ciência é poder replicar um experimento e, nessa replicação, nós bem sabemos que a eficácia de um feitiço não é como uma receita de bolo que qualquer pessoa vai lá, faz e dá certo. Nem receita de bolos são tão simples assim, imagine feitiços!... Há muitos elementos sutis e inexplicáveis pela ciência, portanto, esse experimento seria extremamente difícil de ser conduzido e, pior ainda, de obtêr um resultado que batesse o martelo: "Bruxaria é ciência!". É simplesmente inviável. Percebe como as coisas não se encaixam? É porque não é para se encaixar mesmo.

Outra questão em que o ceticismo pode contribuir para a clareza em nossa prática é como lidamos com eventos pessoais. Um exemplo bem comum é o de ver vultos (veja o artigo da USP: "Viu algum vulto estranho por aí? A Psicologia pode ajudar!"). É essencial buscar causas físicas e reais para esse tipo de experiência ou sinais antes de pular para conclusões precepitadas. Negar as contribuições da ciência só porque não corroboram com as suas crenças não ajuda em nada. A consequência disso é viver em um mundo de fantasia, no "mundo da lua", sem aterramento nenhum. Oras, você não acha que é importante termos uma conexão com o mundo espiritual, mas também com o mundo físico? Afinal, a natureza é parte do mundo físico, mas nós vemos um mundo além desse mundo e caminhamos entre eles. Se a sua ideia é ter equilíbrio entre esse dois mundos, cuidado para não entrar em um desses círculos de fadas* e ficar por lá!... É importante saber esse caminho de volta.

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Entendo que, principalmente quando descobrimos a Bruxaria e tudo o que vem com ela, é realmente um novo mundo que se abre em nossa frente e a sede de se entregar é grande. Seja pela inexperiência, medo ou vontade viver a magia em uma realidade que às vezes é monótona ou até desagradável, é saudável que, com o tempo, você busque desenvolver essa maturidade em sua prática. Não estou dizendo que você tem que ser uma pessoa 100% cética porque isso também não funciona para uma bruxa, mas sim te digo para trabalhar a sua percepção e discernimento. Ter senso crítico. Não acreditar em tudo que te falam. Entender como e por quê as coisas funcionam. Tomar cuidado para não ser uma pessoa susceptível e acabar entrando em seitas, ser vítima de charlatanismo, cair em teorias da conspiração ou até mesmo cometer um crime ao prometer cura de doenças sem a devida licença para tal (i.e., sem registro no conselho de medicina, enfermagem, psicologia, etc).

Esse alerta é principalmente porque hoje a internet está lotada de pseudociências e, infelizmente, essas pseudociências têm se infiltrado de uma forma muito estranha, ao meu ver, dentre praticantes de magia e bruxaria. Tem muito curso, muito charlatanismo, muitas promessas de curas milagrosas. Às vezes, a pessoa é até bem intencionada e não entende a real dimensão disso. Seja criteriosa(o) com o que você acredita, estuda e pratica. Veja também o outro lado e tire as suas próprias conclusões, especialmente se a conversa mistura termos científicos e médicos com espiritualidade. Aliás, tem um canal de divulgação científica chamado Física e Afins que recomendo muito. Alguns vídeos interessantes, são:

Bom, mas voltando para a prática na Bruxaria, como podemos fazer para ter esse equilíbrio entre ceticismo e espiritualidade? Primeiro, é o que já disse: tenha senso crítico e não acredite nas coisas de cara. Sempre busque explicações lógicas para as coisas. Segundo, aterrar é imprescindível! O aterramento pode ser feito de várias formas: alimentação natural e saudável, atividade física, contato com a natureza e com o "mundo real", trabalhar sua mente não só à respeito da espiritualidade, mas também em outras áreas da sua vida (especialmente se forem mais "lógicas" e que não possuem nenhuma ligação com esse lado, para equilibrar), etc.

E como faz para não se tornar cético até demais? Da mesma forma que você busca se aterrar, você também busca a conexão com o seu poder, com o inexplicável, com a Alma. Nem tudo é para ser analizado, estudado, mas sim sentido, porque é algo que vai além do nosso entendimento humano. Nós, bruxas, como disse anteriormente, caminhamos entre os mundos. Chances de que você, assim como eu, caminha entre esses mundos com Hekate. Essa linha é tênue. Busque o seu ponto de equilíbrio.

Por fim, encerro com uma frase do Jason Miller do artigo que citei no início:

* Círculos de fadas: São círculos formados por vários cogumelos. Apesar de hoje sabermos a explicação científica para isso, dizem que são portais e que, caso alguém entre em um desses círculos, acaba sendo transportada para o mundo das fadas, em outra dimensão, e nunca mais retorna. A minha comparação é no sentido de que nós podemos nos deslocar da realidade por conta da nossa prática de tal forma que causa um desequilíbrio entre o que é real e o que não é, e começamos achar que tudo é sinal, tudo é espírito, etc., ao invés de optar pela sensatez. Nesse caso, não há discernimento entre percepções pessoais e experiências psíquicas.

** Cloud Cuckoo Land: Termo em inglês que significa viver em um mundo de fantasia, pensar que coisas completamente impossíveis podem acontecer, em vez de entender como as coisas realmente são.